Diversas vezes nos deparamos com alguém que diz ter sido cobrado por telefone, ou uma carta de cobrança, ou até mesmo teve seu nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito.
Ocorre que, mesmo sendo dívidas legais, não é incomum tal cobrança ser realizada de formas inadequadas. Nesses casos, a cobrança é considerada uma cobrança abusiva, como por exemplo, no excesso no direito de cobrança.
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Importante frisar que é lícito ao fornecedor realizar cobrança dos consumidores, seja executando dívidas ou contratando empresas para fazer essa cobrança. A saber, o fornecedor pode usar meios LÍCITOS para ser feita a cobrança.
No entanto, NÃO pode o fornecedor abusar desses meios. Em outros termos, o fornecedor, no exercício das suas próprias razões, não pode abusar na prática da cobrança da dívida.
Como fornecedor, ele tem resguardado o direito de cobrar suas dividas, o que não pode fazer é abusar do seu direito de cobrança. Sendo assim, cabe então o questionamento: Até onde pode exercer o direito de cobrar?
Existem várias formas licitas de recuperar uma dívida, a mais relevantes de todas é a ação de cobrança: demanda judicial contra o devedor inadimplente.
O dispositivo (art. 42) visa regular a cobrança extrajudicial, pois nota-se que são nesses momentos de cobrança extrajudicial que ocorrem os abusos e em situações na qual o consumidor é abordado das mais variadas formas possíveis como em seu trabalho, na sua residência e na sua atividade de lazer.
Portanto, a intenção do legislador ao normatizar o art. 42 foi proteger a privacidade e a imagem pública do cidadão, na sua qualidade de consumidor. Desse modo, proíbe-se, fundamentalmente, a sua exposição ao ridículo, a interferência na sua privacidade e a utilização de inverdades.
O artigo 42 deve ser lido em conjunto com o artigo 71, também do CDC. O artigo 71 tipifica como infrações penais essas práticas abusivas de cobranças, o qual dispõe que:
Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:
Pena Detenção de três meses a um ano e multa.
Nesse sentido, no caso da prática da cobrança abusiva por parte de uma pessoa jurídica, os seus sócios podem sofrer a pena de detenção.
Numa leitura conjugada dos dois artigos, depreende-se a vedação dos seguintes elementos para a cobrança de dívidas:
Não poderá ser exporto o consumidor a ridículo, e a constrangimento (expor a ridículo e constranger podem ser caracterizados, quando, por exemplo, o credor tornar a divida conhecida para outra pessoa além do devedor, como os vizinhos, amigos, etc.);
Não poderá o consumidor ser submetido a ameaças;
Não poderá o consumidor receber informações falsas; e
Não poderá o consumidor ser interferido no trabalho, lazer ou descanso.
Vistas tais hipóteses, ressalte-se que, uma vez que o procedimento do credor cause danos ao consumidor, moral ou patrimonial, tem este direito à indenização.
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
Pode-se dar como exemplo uma situação extrema como aspectos individuais no qual, por conta da cobrança da dívida no trabalho, o consumidor devedor perdeu o emprego, ganhou a antipatia de seus vizinhos, ou então a cobrança foi feita publicamente, o envergonhado perante terceiros, ferindo sua reputação, teve seu casamento afetado, etc.
Em todos estes e em outros casos de prejuízos, haverá o dever do fornecedor de indenizar o consumidor lesado.
Assim, segue jurisprudência a respeito:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INADIMPLÊNCIA – COBRANÇAS VEXATÓRIAS – INSISTENTES TELEFONEMAS PARA LOCAL DE TRABALHO VIZINHO – VEDAÇÃO DO ART. 42 DO CDC – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – PRESERVAÇÃO DO FIXADO NA SENTENÇA – RECURSOS AO QUAIS SE NEGA PROVIMENTO. A instituição financeira tem o direito de cobrar a dívida através de ligações telefônicas, ato que, por si só, não configura meio abusivo. No caso dos autos, no entanto, restou evidenciado que a cobrança ultrapassou os limites do exercício regular de direito, já que as ligações telefônicas foram dirigidas para o local de trabalho da devedora, com atendimento por terceiros, além de usar de tons ameaçadores para obtenção de êxito na empreitada, expondo-a ao ridículo, caracterizando o constrangimento descrito no art. 42 do CDC, impondo-se o dever de indenizar a vítima. Considerando-se o grau de culpa da instituição financeira, diante da inobservância das cautelas legais ao proceder a cobrança de dívida, assim como as características da vítima, a indenização fixada deve ser mantida, por constituir valor capaz de compensar os efeitos do prejuízo moral sofrido e inibir os apelantes de eventual reincidência. (TJ-MS - APL: 00577985720108120001 MS 0057798-57.2010.8.12.0001, Relator: Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, Data de Julgamento: 17/05/2016, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 18/05/2016)
Por fim, cabe acrescentar que, além das sanções civis, podem e devem também ser aplicadas as sanções administrativas nas hipóteses de cobrança abusiva, sendo estabelecido, por exemplo, penas de multa, penas de suspensão do fornecimento do serviço, suspensão temporária da atividade, cassação de licença do estabelecimento ou da atividade em prejuízo do fornecedor credor que praticou tal conduta.
Bacharel em Direito e Especialista em Direito do Trabalho, Família e Consumidor.
Rafael Lança Morozeski, formado em Direito pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV), na cidade de Vitória/ES, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Espírito Santo - sob o n. 26.767; Pós-Graduado pela Faculdade Damásio, com título de especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho (Cursando), atua prestando um atendimento humanizado, dedicado e compromissado. Como profissional, presta atendimento especializado em Direito do Trabalho, com casos como demissões, invalidez, assédio moral, benefícios sociais e acidentes de trabalho. Também atende demandas das áreas dos direitos da família e sucessões, civil, do consumidor e previdenciário. Além disso, atua como correspondente jurídico;
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