Contratos internacionais- principais Incoterms e documentos necessários para exportação
1. Introdução
A origem histórica do contrato e venda está ligada ao conceito de troca. Na civilização primitiva predominava a troca de objetos. Esse sistema foi aplicado durante vários séculos, quando certas mercadorias passaram a ser usadas como padrão para facilitar o intercâmbio e o comércio de bens entre os homens.
A princípio eram utilizadas cabeças de gado, posteriormente os metais preciosos, e quando estes começaram a ser cunhados com o seu peso, ganhando valor determinado, surgiu a moeda, e com ela a compra e venda.
Denomina-se compra e venda o contrato bilateral por meio do qual uma das partes se obriga a transferir o domínio de uma coisa a outra, mediante contraprestação de uma certa quantia em dinheiro.
Desse modo surge também o caráter obrigacional do contrato, no qual por ele os contratantes se obrigam reciprocamente.
O Código Civil vigente nos dá um conceito de Compra e Venda: “Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.”
Anteriormente, o contrato de compra e venda civil e o contrato de compra e venda mercantil eram diferenciados, de modo que a compra e venda mercantil era regida pela primeira parte do Código Comercial e a compra e venda civil era regida pelo Código Civil. No entanto, a partir do Código Civil de 2002 as distinções legais entre os contratos foram eliminadas, sendo revogada a primeira parte do Código Comercial.
Os contratos de compra e venda podem ter bens de toda natureza, corpóreos e incorpóreos. No entanto, a transferência do domínio depende de outro ato, da tradição, para os móveis, e do registro, para os bens imóveis.
No tocante à compra e venda internacional, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro estabelece que “para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem”.
2. Natureza Jurídica
A compra e venda é um contrato consensual, bilateral e oneroso, isto é, opera-se, em regra, a partir do simples consentimento das partes quanto ao objeto e ao preço, resultando para ambas as partes direitos e obrigações: o vendedor obriga-se a transferir o domínio de certa coisa e o comprador, a pagar certo preço em dinheiro.
A regra é a de que basta o acordo de vontade de dois ou mais sujeitos de direito para a formação do contrato. Sendo assim, são consensuais os contratos quando constituídos pela mera vontade das partes. É o que acontece, por exemplo, com a compra e venda, que “considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço” (CC, art. 482).
Diz-se que a compra e venda é bilateral porque ambas a partes assumem direitos e obrigações uma perante a outra. Nesse sentido, preleciona Fábio Ulhôa Coelho: “(...) Há determinados contratos em que duas partes assumem obrigações, como na compra e venda, por exemplo (o vendedor tem o dever de transferir o domínio da coisa e o comprador, o de pagar o preço), e há outros em que apenas um dos contratantes tem obrigações como no caso do mútuo (o mutuário deve restituir o bem mutuado ao mutuante, que, por sua vez, não é devedor de nenhuma obrigação). Continua Ulhôa Coelho: “Nos contratos bilaterais, os contratantes são ao mesmo tempo credor e devedor de prestações, um perante o outro, enquanto, nos unilaterais, uma das partes é credora e a outra devedora”.
Particularidade interessante dos contratos bilaterais é que o cumprimento do que foi contratado é condição para o contratante exigir a prestação a que tem direito. Trata-se da exceção de contrato não cumprido (“exceptio non adimpleti contractus”), vale dizer, quem está em mora com suas obrigações contratuais não tem o direito de constranger o outro a cumprir sua parte na avença (CC, art. 476).
Vale ressaltar que a exceção do contrato não cumprido é somente aplicável nos contratos bilaterais, posto que nos unilaterais, na medida em que um só contratante tem obrigações, não existe reciprocidade de prestações, sendo impossível condicionar a execução do contrato por uma das partes ao implemento devido pela outra.
Há também, na hipótese de descumprimento, a presunção de cláusula resolutiva dos contratos bilaterais, segundo a qual considera-se autorizado qualquer um dos contratantes a dar o trato por desfeito, na hipótese de o outro faltar com o cumprimento de sua parte.
Na maioria das vezes o contrato é comutativo, ou seja, refere-se a coisas certas e determinadas, podendo, contudo, estabelecer-se como aleatório.
3. Elementos essenciais
Três são os elementos essenciais à formação do contrato de compra e venda: a coisa, o preço e o consentimento.
A coisa é todo bem móvel, semovente ou imóvel utilizado pelo empresário – ou sociedade empresária – no exercício de sua atividade, para servir diretamente à revenda ou, indiretamente, para compor os atos empresariais.
Maria Helena Diniz especifica os requisitos da coisa:
(a) existência corpórea ou incorpórea; (b) individualidade, isto é, objeto determinado ou determinável; (c) disponibilidade no comércio; (d) possibilidade de ser transferida ao comprador.
Podem ser objeto do contrato de compra e venda empresarial bens que tenham existência, incluindo tanto os bens corpóreos, móveis, imóveis ou semoventes, como igualmente os bens incorpóreos, entre os quais a marca, o direito de patente, valores mobiliários e outros tantos objetos que integram o estabelecimento empresarial do empresário individual ou o patrimônio da sociedade empresária. É possível que os contratantes acordem sobre a entrega de produtos ainda não existentes, sujeitos à colheita futura, como os frutos agrícolas, ou à fabricação, quando se tratar de produção industrial, ou, ainda, à manufatura. Se a coisa não chegar a existir, o contrato é declarado sem efeito, salvo se as partes tinham intenção de concluir um contrato aleatório (CC, art. 483).
Denomina-se aleatório o contrato que tenha por objeto coisa sujeita a uma álea, isto é, a um acontecimento desconhecido e incerto.
São exemplos de contratos de compra e venda aleatórios tanto as coisas que tem possibilidade de existir, como, por exemplo, determinada colheita, quanto as que são totalmente incertas de existir algum dia, como ocorre com a compra de um bilhete de loteria, o produto de uma rede de pesca jogada no mar, a subscrição de ações que ainda não estão no mercado etc.
A disponibilidade no comércio refere-se à possibilidade de aquisição em oposição às coisas fora do comércio, como ocorre com os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial (CC, art. 100) e outros por força legal ou declaração de vontade (como os bens com cláusula de inalienabilidade).
As partes devem estabelecer um preço em dinheiro. O consenso é essencial, sendo nulo o contrato que deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do preço (CC, art. 489). Ao estabelecerem o montante a ser pago pelo comprador, os contratantes deverão utilizar valores em moeda nacional, podendo, contudo, valer-se de moedas estrangeiras em alguns contratos, como nos de compra e venda internacional.
O preço, contudo, pode não estar determinado desde a formação do contrato, acordando as partes que se estabeleça posteriormente, por um árbitro, por critérios objetivos ou, ainda, que se sujeite ao regramento legal a respeito da matéria. Portanto, embora não determinado, o preço será sempre determinável, por cláusula contratual que fixe critérios objetivos (arbitral, mercado, bolsa, índices ou parâmetros objetivos) ou por sujeição dos contratantes aos critérios fixados pelo legislador (tabelamento ou preço corrente).
4. Cláusulas relevantes no contrato de compra e venda internacional
Os contratos de compra e venda internacional regulam a relação das partes sob vários aspectos, e por isso, todas as cláusulas são de extrema importância. Devem, portanto, ser redigidos com cuidado e prudência, a fim de que, na eventualidade de um desentendimento futuro, sirvam como fiel guia da vontade originária das partes, em cada um dos detalhes da negociação.
Assim, algumas cláusulas são essenciais e de fundamental importância para celebração do contrato, tendo em vista que a importação e exportação de bens é um assunto extremamente complexo e requer a pactuação de acordos sobre vários aspectos, dentre eles: as condições de venda, transporte, seguro e meios de pagamento (que muitas vezes envolvem serviços financeiros), divisão dos ônus por serviços portuários e custos alfandegários e obrigações adicionais como preparação de documentos e licenças governamentais.
Nesse sentido, válido destacar algumas cláusulas de maior importância nos contratos de Compra e Venda Internacional:
a) Preço:
No contrato de compra e venda internacional, a cláusula relativa ao preço da coisa merece atenção especial. Isto porque é essencial que a moeda a ser usada na transação esteja devidamente explicitada no contrato. Embora o direito pátrio só permita, em regra, que o pagamento seja feito em moeda nacional corrente, há uma exceção para os contratos de importação e exportação. Nesses casos, com base no Dec.-lei n. 857/69, art. 2 º, I, podem as partes convencionarem moeda diversa.
Ademais, é elementar indicar qual o país de origem da moeda, a fim de evitar confusão na identificação da moeda escolhida. Afinal, há dólares, libras e pesos, entre outras espécies, emitidas por diversos países. Por isso, é importante especificar, no contrato, que se trata, por exemplo, de dólares americanos, libras esterlinas, pesos argentinos, etc.
b) Forma de Pagamento:
A forma de pagamento a ser adotada em um contrato internacional de compra e venda de mercadorias deve levar em conta o grau de confiança existente entre as partes contratantes bem como deve estar claramente disposta no contrato.
Em geral, os meios mais utilizados são a transferência bancária direta, a Remessa Direta de Documentos, a Cobrança Documentária e a Carta de Crédito. A carta de Crédito geralmente é o meio mas utilizado para a transferência em Contratos Internacionais.
Em cada uma das formas de pagamento, é importante indicar quais documentos serão exigidos para comprovar o embarque das mercadorias ou o pagamento antecipado. Esta exortação é válida principalmente para as Cartas de Crédito, uma vez que as exigências documentais para sua aceitação pelos bancos costumam ser extremamente rígidas.
c) Cláusula de eleição de Foro e cláusula de Arbitragem:
A Cláusula de eleição de foro consiste na escolha do tribunal que será competente para resolver eventuais litígios decorrentes da relação contratual. Assim, entende-se por eleição de foro o comprometimento das partes contratantes a reclamar eventuais direitos derivados do contrato em determinado órgão jurisdicional. Trata-se, pois, de um pacto acessório, no qual as partes elegem o foro competente para conhecer de eventual litígio judicial.
O princípio da autonomia da vontade em relação aos contratos internacionais deve possibilitar a escolha do foro para as futuras controvérsias advindas deste pacto, desde que estas escolhas não firam a lei interna e a Ordem Pública.
A cláusula de eleição de foro em nosso ordenamento jurídico é perfeitamente admitida pela doutrina e jurisprudência.
Em se tratando de comércio internacional, a solução de controvérsias é um serviço que deve ser prestado de forma célere, eficiente e econômica. Nesse sentido, vigora um regime de livre concorrência entre os prestadores de serviço, que tanto podem ser os tribunais judiciais ou a arbitragem comercial internacional. Conferir liberdade às partes em relação à escolha de um tribunal nacional significa admitir que elas não precisam ser tuteladas quanto às suas decisões negociais e podem, em consequência, eleger o foro que melhor lhes aprouver, quer pela sua notória especialidade na matéria, quer pelos custos dos serviços advocatícios, ou, ainda, pela celeridade e qualidade do aparelho judiciário.
Portanto, cabe aos contratantes, na eleição do foro em contratos internacionais, verificar as seguintes questões, entre outras: regra de conexão do país do foro eleito; se a lei material aplicável na solução de eventual controvérsia atende aos interesses dos contratantes; se a sentença proferida no foro eleito será exequível na jurisdição na qual se processará a execução.
Somente assim os contratantes poderão eleger o foro em contrato internacional com uma razoável segurança jurídica.
Já a cláusula arbitral ou compromissória é a cláusula onde as partes determinam que as disputas relativas a um contrato serão resolvidas através de arbitragem, é fruto da autonomia das vontades, sendo de natureza estritamente negocial.
A arbitragem é uma forma de solução de conflitos que busca compor os interesses das partes sem necessidade de acesso à justiça estatal, exceto na fase de execução da decisão. Grande parte dos países tem leis próprias regulando a arbitragem, e aceitam as decisões arbitrais como verdadeiras sentenças judiciais, executáveis e irrecorríveis.
As partes desejam, de boa-fé, solucionar quaisquer disputas ou conflitos oriundos do contrato celebrado de forma rápida e eficiente, por meio de árbitros capacitados e especializados na matéria da disputa.
Nesse sentido, as partes, buscando a melhor relação de custo-benefício oferecida no mercado, convencionam entre si, livremente e amparadas na Lei 9.307/96, que quaisquer disputas, litígios ou conflitos oriundos deste contrato, ou a ele referente, serão resolvidos através de negociação, conciliação, mediação e/ou de arbitragem.
Ao se adotar uma cláusula arbitral, é importante criar uma cláusula "Cheia". Isto é, uma cláusula que indique, antecipadamente, qual órgão presidirá a arbitragem, qual será a lei aplicável, quantos árbitros comporão o painel, onde ocorrerá a arbitragem, e quais serão as regras procedimentais adotadas.
A Cláusula Compromissória Cheia é aquela que de forma expressa faz referência às regras que conduzirão eventual procedimento arbitral surgido do contrato. Essa cláusula pode indicar uma câmara arbitral e seu regulamento ou regras particulares para guiar a resolução de eventual conflito.
A ausência da parte regularmente convocada ou sua discordância em firmar o compromisso arbitral não evita o início do procedimento arbitral e a solução da controvérsia através da arbitragem. Contudo, ao se indicar uma Cláusula Vazia, corre-se o risco de ter de recorrer à justiça estatal para definir estas lacunas.
As mais importantes câmaras arbitrais do mundo guiam-se por dois regulamentos básicos: As regras da Câmara Internacional de Comércio, de Paris, e a Lei Modelo de Arbitragem Comercial Internacional, publicada pela Comissão das Nações Unidas para o Direito do Comércio Internacional (UNCITRAL Model Law on International Commercial Arbitration). Ambas são regras modernas, que buscam conceder celeridade e confiabilidade ao procedimento arbitral. Recomenda-se, portanto, adotar uma das duas alternativas, de modo a diminuir os riscos da arbitragem.
No direito brasileiro, a cláusula compromissória é uma espécie de convenção de arbitragem. Sua definição é dada pelo artigo 4º da lei 9.307 de 23/09/1996 (lei de arbitragem ou lei Marco Maciel): "A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato".
d) Claúsula de Force Majeure:
Como qualquer outra cláusula contratual, a Force Majeure usualmente retratada na sua forma francesa tem previsão expressa no contrato para que, em casos de eventos de força maior e ou extraordinários, o mero descumprimento da obrigação estariam aptos a gerarem suspensão, execução parcial ou descontinuidade contratual.
Trata-se, portanto, de circunstâncias imprevisíveis à época da contratação, as quais as partes não podiam, por suas próprias vontades, afastar, revelando-se, ainda, como característica da força maior, o fato de que referidas circunstâncias devem ter potencial suficiente para afetar de maneira direta a execução das respectivas obrigações.
Assim, a Câmara de Comércio Internacional preceituou, em linhas gerais, que este tipo de modalidade de cláusula refere-se “a fatos que liberam as instituições ou indivíduos da responsabilidade de não conseguirem atender a uma obrigação contratual, por exemplo: enchentes, epidemias, terremotos, guerras, revoluções ou insurreições, convulsões políticas, greves de trabalhadores e empregadores ou distúrbios sociais"(Nota da CCI constante da Carta Circular 007/2003.)
Assim, para que haja a configuração de caso fortuito ou força maior, são necessários alguns elementos, quais sejam: a) o fato deve ser necessário, não determinado por culpa do devedor, isto é, imprevisível; b) o fato precisa ser superveniente e inevitável. Ou seja, durante uma guerra, ao ser celebrado um contrato, não pode o devedor, a posteriori, alegar dificuldades oriundas da guerra para se exonerar do que deveria ter cumprido; c) o fato deve ser irresistível, fora do alcance do poder humano. Isto é, a superveniência do fato não deve poder ser sobrepujada para permitir a execução do contrato.
Neste diapasão, a cláusula de força maior é excludente de responsabilidade, uma exceção ao princípio do pacta sunt servanda, por descumprimento contratual causado por fatos de natureza extraordinária, imprevisíveis e inevitáveis, de modo que dois elementos que devem estar presentes para poder ser aplicado a cláusula de força maior, ausência de culpa e inevitabilidade do evento, elemento subjetivo e objetivo respectivamente, isto é, não deve presumir-se que haja inadimplemento voluntário, pois, a partir deste fenômeno, estar-se-ia diante de um outro tratamento dado a determinada situação.
e) Claúsula Hardship:
Este tipo de cláusula contratual foi concebida como forma de facilitar ou dar maior praticidade na busca de alternativas que propiciem o adimplemento da obrigação contratual em casos de eventos extraordinários.
Fora concebida, portanto para possibilitar um ajuste contratual, na eventualidade da ocorrência de um evento, futuro e imprevisto na época da confecção do mesmo, seja temporário ou permanente, que torne extremamente oneroso o cumprimento por uma das partes.
Na visão de Jairo Silva Melo considera-se hardship uma situação em que a alteração de fatores políticos, econômicos, financeiros, legais ou mesmo tecnológicos que vigoravam na época da celebração do contrato resulte em consequências danosas para uma das partes. Tais modificações podem ser causadas por fenômenos geofísicos, pelas condições socioeconômicas vigentes no sistema internacional ou ainda pelas alterações no mercado internacional, advindas de crises estruturais, escassez, flutuação de preços, etc., e suas respectivas consequências na política comercial, como restrições, medidas de protecionismo, etc.
Referida cláusula possui semelhante conotação a adotada a Força Maior, no entanto, o que as diferencia é que na primeira, tal condição de evento extraordinário possibilita a alteração contratual para que se efetive o cumprimento e o adimplemento do contrato ao passo que na segunda, apenas se verifica a possibilidade de excluir responsabilidade de uma das partes em face de tais eventos de força maior.
Assim, é de se observar que a possibilidade que o art. 478 do Código Civil nos traz não é somente a da resolução do contrato, uma vez ocorrendo a onerosidade excessiva, mas também a de modificar cláusulas ou permitir a revisão do contrato.
Nesse contexto, tem-se o dispositivo do diploma civil como algo muito próximo daquilo que se entende internacionalmente como cláusula de hardship, que almeja a continuação do contrato, desde que haja a revisão das bases sobre as quais o contrato anteriormente foi fundado.
Portanto, a cláusula hardship é um complemento em face da Força Maior, na medida em que a primeira permite a alteração contratual e a segunda permite tão-somente a exclusão da responsabilidade gerada por casos fortuitos ou de força maior.
5. Incoterms
Com a complexidade das diversas normas que tratam das transações mercantis internacionais, surgiu a necessidade de padronizar cláusulas que dizem respeito às responsabilidades de cada uma das partes envolvidas. Foi, portanto, com a finalidade de uniformizar os encargos das pessoas jurídicas que realizam entre si trocas comerciais que a International Chamber of Commerce (Câmara de Comércio Internacional) criou, em 1936, cláusulas padrões, que são chamadas de Incoterms (Termos Internacionais de Comércio).
Tais cláusulas passaram por várias revisões ao longo dos anos e a atualização mais recente é a de 2010, quando a ICC agrupou os termos em quatro grupos diferentes: o grupo E (contratos de partida), que inclui a cláusula EXW; o grupo F (transporte principal não pago), que engloba os Incoterms FCA, FAS e FOB; o grupo C (de transporte principal pago), que inclui os Incoterms CFR, CIF, CPT e CIP; e o grupo D (de chegada), que diz respeito às cláusulas DAT, DAP e DDP.
No direito pátrio, a resolução nº 21, de 7 de abril de 2011 da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) dispõe sobre os Incoterms (Termos Internacionais de Comércio) e estabelece que nas exportações e importações brasileiras serão aceitas quaisquer condições de venda praticadas no comércio internacional, desde que compatíveis com o ordenamento jurídico nacional. Por meio desta resolução, o Brasil adotou os Incoterms 2010, da International Chamber of Commerce. São eles, segundo a resolução:
EXW
EX WORKS (named place of delivery)
NA ORIGEM (local de entrega nomeado)
O vendedor limita-se a colocar a mercadoria à disposição do comprador no seu domicílio, no prazo estabelecido, não se responsabilizando pelo desembaraço para exportação nem pelo carregamento da mercadoria em qualquer veículo coletor.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
Nota: em virtude de o comprador estrangeiro não dispor de condições legais para providenciar o desembaraço para saída de bens do País, fica subentendido que esta providência é adotada pelo vendedor, sob suas expensas e riscos, no caso da exportação brasileira.
FCA
FREE CARRIER (named place of delivery)
LIVRE NO TRANSPORTADOR (local de entrega nomeado)
O vendedor completa suas obrigações e encerra sua responsabilidade quando entrega a mercadoria, desembaraçada para a exportação, ao transportador ou a outra pessoa indicada pelo comprador, no local nomeado do país de origem.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
FAS
FREE ALONGSIDE SHIP (named port of shipment)
LIVRE AO LADO DO NAVIO (porto de embarque nomeado)
O vendedor encerra suas obrigações no momento em que a mercadoria é colocada, desembaraçada para exportação, ao longo do costado do navio transportador indicado pelo comprador, no cais ou em embarcações utilizadas para carregamento da mercadoria, no porto de embarque nomeado pelo comprador.
Utilizável exclusivamente no transporte aquaviário (marítimo ou hidroviário interior).
FOB
FREE ON BOARD (named port of shipment)
LIVRE A BORDO (porto de embarque nomeado)
O vendedor encerra suas obrigações e responsabilidades quando a mercadoria, desembaraçada para a exportação, é entregue, arrumada, a bordo do navio no porto de embarque, ambos indicados pelo comprador, na data ou dentro do período acordado.
Utilizável exclusivamente no transporte aquaviário (marítimo ou hidroviário interior).
CFR
COST AND FREIGHT (named port of destination)
CUSTO E FRETE (porto de destino nomeado)
Além de arcar com obrigações e riscos previstos para o termo FOB, o vendedor contrata e paga frete e custos necessários para levar a mercadoria até o porto de destino combinado.
Utilizável exclusivamente no transporte aquaviário (marítimo ou hidroviário interior).
CIF
COST, INSURANCE AND FREIGHT (named port of destination)
CUSTO, SEGURO E FRETE (porto de destino nomeado)
Além de arcar com obrigações e riscos previstos para o termo FOB, o vendedor contrata e paga frete, custos e seguro relativos ao transporte da mercadoria até o porto de destino combinado.
Utilizável exclusivamente no transporte aquaviário (marítimo ou hidroviário interior).
CPT
CARRIAGE PAID TO (named place of destination)
TRANSPORTE PAGO ATÉ (local de destino nomeado)
Além de arcar com obrigações e riscos previstos para o termo FCA, o vendedor contrata e paga frete e custos necessários para levar a mercadoria até o local de destino combinado.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
CIP
CARRIAGE AND INSURANCE PAID TO (named place of destination)
TRANSPORTE E SEGURO PAGOS ATÉ (local de destino nomeado)
Além de arcar com obrigações e riscos previstos para o termo FCA, o vendedor contrata e paga frete, custos e seguro relativos ao transporte da mercadoria até o local de destino combinado.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
DAT
DELIVERED AT TERMINAL (named terminal at port or place of destination)
ENTREGUE NO TERMINAL (terminal nomeado no porto ou local de destino)
O vendedor completa suas obrigações e encerra sua responsabilidade quando a mercadoria é colocada à disposição do comprador, na data ou dentro do período acordado, num terminal de destino nomeado (cais, terminal de contêineres ou armazém, dentre outros), descarregada do veículo transportador mas não desembaraçada para importação.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
DAP
DELIVERED AT PLACE (named place of destination)
ENTREGUE NO LOCAL (local de destino nomeado)
O vendedor completa suas obrigações e encerra sua responsabilidade quando coloca a mercadoria à disposição do comprador, na data ou dentro do período acordado, num local de destino indicado que não seja um terminal, pronta para ser descarregada do veículo transportador e não desembaraçada para importação.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
DDP
DELIVERED DUTY PAID (named place of destination)
ENTREGUE COM DIREITOS PAGOS (local de destino nomeado)
O vendedor completa suas obrigações e encerra sua responsabilidade quando a mercadoria é colocada à disposição do comprador, na data ou dentro do período acordado, no local de destino designado no país importador, não descarregada do meio de transporte. O vendedor, além do desembaraço, assume todos os riscos e custos, inclusive impostos, taxas e outros encargos incidentes na importação.
Utilizável em qualquer modalidade de transporte.
Nota: em virtude de o vendedor estrangeiro não dispor de condições legais para providenciar o desembaraço para entrada de bens do País, este termo não pode ser utilizado na importação brasileira, devendo ser escolhido o DAT ou DAP no caso de preferência por condição disciplinada pela ICC.
6. Uma das Inconterms mais comuns é o EXW
Conforme já mencionado, os chamados Incoterms (International Commercial Terms / Termos Internacionais de Comércio) servem para definir, dentro da estrutura de um contrato de compra e venda internacional, os direitos e obrigações recíprocos do exportador e do importador, estabelecendo um conjunto-padrão de definições e determinando regras e práticas neutras, como por exemplo: onde o exportador deve entregar a mercadoria, quem paga o frete, quem é o responsável pela contratação do seguro.
Enfim, os Incoterms têm esse objetivo, uma vez que se trata de regras internacionais, imparciais, de caráter uniformizador, que constituem toda a base dos negócios internacionais e objetivam promover sua harmonia. Na prática, o uso de um Incoterm significa a inclusão de uma cláusula contratual complexa, que estabelecerá as obrigações do comprador e do vendedor quanto a vários pontos, dentre eles responsabilidades pela perda da mercadoria, momento de transferência da propriedade, responsabilidade por arranjar o frete, seguro e documentação, entre outras.
Ou seja, propõem o entendimento entre vendedor e comprador, quanto às tarefas necessárias para deslocamento da mercadoria do local onde é elaborada até o local de destino final (zona de consumo): embalagem, transportes internos, licenças de exportação e de importação, movimentação em terminais, transporte e seguro internacionais etc.
É intuitivo que, quanto maiores as responsabilidades do vendedor, maior será o preço. Por isso, a escolha correta do Incoterm também é importante para a definição do preço. Em geral, os preços são oferecidos de acordo com um Incoterm e um local de entrega específicos.
A Incortem EXW - Ex Works estabelece que a mercadoria em questão, objeto do contrato de compra e venda internacional, será entregue já no próprio estabelecimento do vendedor, em local designado. Assim, o comprador receberá a mercadoria no próprio local de produção (fábrica, plantação, mina, armazém) e na data combinada. Deste modo, todas as despesas e riscos cabem ao comprador, exaurido o vendedor de responsabilidade após a retirada da mercadoria no em seu estabelecimento (local designado). Portanto, o comprador suporta todos os custos e riscos relacionados com o transporte, desde a saída da fábrica até ao local de destino (a Incoterm de maior responsabilidade para o importador).
Nota-se portanto que o termo EXW representa as obrigações mínimas para o vendedor, vez que desde a retirada da mercadoria em seu estabelecimento, o vendedor não possui mais responsabilidade sobre a mercadoria, conforme representado na imagem abaixo:
Ou seja, neste caso, o vendedor limita-se a colocar a mercadoria à disposição do comprador no seu domicílio, no prazo estabelecido, não se responsabilizando pelo desembaraço para exportação nem pelo carregamento da mercadoria em qualquer veículo coletor, sendo utilizável em qualquer modalidade de transporte. O vendedor também não se responsabiliza por qualquer elemento do custo de transporte, frete marítimo, seguro, ou outras formalidades de exportação. Porém, ele tem a obrigação de disponibilizar a mercadoria no prazo estipulado para ser carregada pelo importador.
Contudo, cumpre destacar que no caso de exportação brasileira, em virtude de o comprador estrangeiro não dispor de condições legais para providenciar o desembaraço para saída de bens do País, fica subentendido que esta providência é adotada pelo vendedor.
7. Documentos usados na exportação
Toda operação de compra e venda internacional requer uma série de documentos. Alguns são emitidos pelo próprio exportador (ou por terceiros) e outros pelo Siscomex Esses documentos variam de acordo com o produto, do país de destino e da operação escolhida
Os documentos abaixo poderão ser encontrados diretamente no Siscomex (Sistema Integrado de Comércio Exterior), que é um instrumento administrativo que integra as atividades de registro, acompanhamento e controle das operações de comércio exterior:
RE- Registro de Exportação – é um documento que contém informações de natureza comercial, financeira, cambial e fiscal, que caracterizam uma operação de exportação, definindo seu enquadramento legal. O prazo de validade do RE para embarque das mercadorias, em regra, é de 60 dias contados a partir da data de emissão.
RES- Registro de Exportação Simplificado- versão resumida do Registro de Exportação.
RV- Registro de Venda- é o documento que contém o registro das bases de comercialização de mercadorias cotadas em bolsas internacionais (commodities, minérios, etc). Sua principal finalidade é garantir as condições das negociações ao exportador ou importador, ou seja, manter as condições inalteradas.
DDE- Declaração de Despacho de Exportação- é uma declaração formulada pelo exportador ou seu representante legal, contendo informações sobre o registro de Exportação, identificação da empresa exportadora, dados da mercadoria e identificação do veículo transportador.
CE- Comprovante de Exportação assim que concluída a operação de exportação e sua averbação eletrônica no Siscomex, efetuada pelo fiscal da Receita Federal confirmando o embarque da mercadoria para o exterior.
Documentos comerciais:
Fatura Pro Forma: O documento representa a negociação da operação comercial e sua finalidade é firmar compromisso de compra e venda entre as partes, devendo mencionar as principais características da venda: dados do exportador e importador, descrição da mercadoria, preço, condição de venda, forma de pagamento, provável data de embarque entre outros.
Fatura Comercial: é um dos documentos mais importantes sendo que sua apresentação é indispensável para o importador liberar a mercadoria na alfândega de seu país
Nota fiscal: documento que habilita a circulação interna da mercadoria, desde a saída do estabelecimento até o embarque para o exterior.
Romaneio de Embarque (packing list): documento preenchido pelo exportador que relaciona os volumes de mercadoria a serem embarcados e menciona a o conteúdo de cada volume, com as características das mercadorias.
Conhecimento de Embarque: emitido pela empresa transportadora ou por seu agente, representa o contrato de transporte, o comprovante de entrega da mercadoria. O documento confere ao consignatário o direito à posse da mercadoria no destino.
Apólice ou Certificado de Seguro: documento emitido por uma companhia seguradora com base na proposta feita pelo interessado, exportador ou importador. Cobre riscos de transporte da mercadoria e confere ao segurado o direito de ressarcir-se quando houver ocorrência de sinistro, perdas e danos da mercadoria.
Documentos administrativos:
Certificado de Origem – têm por objetivo atestar que o produto é efetivamente originário do país exportados. Sua emissão é essencial nas exportações para países que concedem preferências tarifárias, São fornecidas por entidades credenciadas, mediante a apresentação da fatura comercial. Dentre os certificados mais utilizados é possível citar: MERCOSUL, ALADI entre outros
Ana Carolina Martin, David Lucena, Marina Pereira, Rodrigo Tonizza e Vinicius Araújo
8. Referências bibliográficas
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DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. Vol. 3, 29ª edição, São Paulo: Saraiva, 2013.
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Carolina Martin
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